05 outubro, 2009

quarenta


Os lençóis puxados até ao pescoço, um ramo de árvore cravado no colchão da cama, a montar uma tenda. Fujo da almofada e abraço os joelhos, sentado, acendo luzes dentro da cama. Ponho o capus do casaco na cabeça. Tenho os pés frios, estico as calças do pijama e tapo-os, balanço-me para a frente e para trás. Vou cantando baixinho. Com as mãos abertas bato no colchão, dou pancadas secas e bato palmas. O braço a sair da tenda, à procura da guitarra. Ponho-a de lado, trago uns quantos livros em branco, um lápis de cor. Um pianinho de brincar também. Tenho um ramo de flores em cima da mesa de cabeceira, ao lado direito da cama. Trago-as para dentro, tiro pétalas e canto baixinho. Dou pancadas secas na cama, a ver as pétalas saltar, a virarem-se ao contrário. Juro ver duas bolhas de sabão passar. Os dias passam-se, o verão vai-se indo embora. A barba grande e o cabelo à frente dos olhos. Tenho latas pequenas de tinta à mão, para ir pintando os cobertores por dentro. As mãos em concha, a segurar as pétalas, a imitar uma chuva, e uma ou duas bolhas de sabão a passar.

let the blind lead those
who can see but cannot feel.

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